Publiquei esta crônica hoje, no “Jornal da Vida”, que acabei de criar.
Detalhe, eu estava acorrentada na minha cela, como todos vocês que me leem neste momento.
“Seria trágico se não fosse cômico”, já diz o dito popular. Mas estar livre enquanto somos aprisionados por criações nossas é no mínimo ultrajante.
Ontem, na reunião da escola, fizeram o comunicado que todo mundo sabia: os celulares e eletrônicos foram enfim proibidos no ambiente escolar, por força da lei.
Eu como mãe, comemoro essa vitória, mas conforme esperado, e graças a Deus eram minoria, alguns pais questionaram a lei. Tudo bem questionarem. Opiniões diversas precisam ser debatidas. Porém com relação ao domínio dos celulares, sobre nós, enquanto seres humanos, passou da hora.
Não podemos deixar que isso se perpetue através dos nossos jovens e crianças.
Por causa da nova legislação a escola dos meus filhos se adequou. Espero que todas as escolas tenham se adequado ou estejam se preparando para isto. Porque a situação fugiu do controle há muito tempo.
Aqui em casa há pelo menos três anos, restringimos o uso de eletrônicos. Os meninos não têm acesso a celular. Antes, especialmente na época da pandemia, 2020 e 2021 mais precisamente, os celulares, meu e do meu marido, eram ferramentas que nos possibilitavam conseguir cumprir uma jornada mínima de trabalho, não me orgulho disso. Mas sei que aconteceu em muitas casas.
Só que ontem, na reunião de boas vindas da escola, eu tomei consciência da tragédia anunciada. Fiquei horrorizada em saber que muitas crianças já tinham um celular pessoal e que levavam para a escola há muito tempo… e é triste saber disso quando meus filhos ainda estão no ensino fundamental anos iniciais, e têm entre 7 e 10 anos.
Quando a coordenadora transmitiu essa informação, eu mais que depressa confirmei com meus filhos. E não recebi a resposta que esperava.
A lei veio em ótimo tempo. Precisamos olhar para dentro das nossas casas. Dentro dos nossos relacionamentos.
Precisamos tomar consciência de que vivemos aprisionados, quando somos seres livres por natureza.
O celular domina de tal maneira nossas vidas, que somos incapazes de perceber que somos prisioneiros dele.
Por conta disso, não lemos bons livros, não olhamos nos olhos de quem amamos, não observamos a beleza ao nosso redor, não temos tempo de pensar em nada, e faz tão bem desconectar o cérebro vez ou outra.
Por conta disso, estamos cada vez mais doentes e cada vez mais sem tempo. Desejamos coisas inalcançáveis e esquecemos das coisas simples que no fim das contas valem mais que tudo. Não sentimos os cheiros, nem os gostos das refeições. Não reservamos o tempo sagrado para agradecer pelo alimento recebido.
Comemos “Fast Food” para poupar o tempo e gastamos o tempo economizado rolando os feeds das redes sociais.
Perdemos o controle e perdendo o controle perdemos também o equilíbrio da própria vida.
E depois de tudo, o que mais me dói, é que ainda que consigamos afastar nossas crianças e adolescentes das telas no tempo em que estão na escola, em casa, nós mesmos, pais e mães, continuamos na prisão. Essa prisão que se tornou, há tempos, uma extensão do nosso corpo, e parece que não tem fim.
Por isso o convite: vamos pelo menos pensar nisso?
Policiar nossas atitudes e limitar nossa dependência pode ser uma questão de sobrevivência.
Tecnologias são ferramentas poderosas, capazes de mudar o mundo numa fração de segundos, mas enquanto elas dominarem a nossa atenção, como têm feito repetidamente ao longo dos anos, continuaremos prisioneiros.
O velho domínio entre a criação e a criatura. E esse, sem dúvida alguma, é o caminho mais próximo do fim.
Adriana C. A. Figueiredo
Escritora e Mãe